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Obrigado GUGU

6 de abr. de 2011

Antes Mal Acompanhada que Solteira - Capitulo 3


E essa é a verdadeira razão por que quero viajar com Will no verão. Porque, desde que
estamos juntos, há três anos, desde a faculdade, nosso relacionamento tem apresentado a
estabilidade de um jipe Isuzu Trooper a 130 por hora em uma curva fechada. Com chuva. E vento.

Quando nos conhecemos, estávamos os dois no penúltimo ano da faculdade. Will tinha acabado de ser transferido de uma universidade famosa do Meio-Oeste para a SUNY (State University of New York) no norte do estado. Tinha enorme desdém pela mentalidade conservadora e americana demais, que infectava não apenas a instituição de ensino que abandonou, mas também a família da qual não tinha como fugir.

Eu conseguia me colocar no lugar dele. Talvez essa tenha sido a primeira coisa que me atraiu nele. A cidadezinha universitária minúscula no oeste do estado de Nova York em que eu crescera tinha semelhanças profundas com a região do Meio-Oeste da qual Will fugia.

Havia o sotaque: o a raso, de nariz franzido, que transforma apple (maçã) em uma palavra de três sílabas (ay-a-pple), esteja você na região de Chicago ou no norte do estado de Nova York.

Havia minha religião católica apostólica romana, à qual pertenciam exatamente todas as pessoas que faziam parte da minha vida, à exceção da minha amiga Tamar Goldstein, a única judia da escola de ensino médio Brookside High, que ficava em casa enquanto todos nós íamos à escola nos misteriosos dias de Rosh Hashaná, em setembro ou outubro.

Havia minha família italiana muito numerosa e espalhada, com suas tradições sufocantes de que todo mundo deveria participar: missa das nove e meia no domingo, seguida por café e cannolis
na casa da minha avó materna e, depois, espaguete na casa da minha avó paterna. Era assim que todos os domingos da minha vida começavam, e continuo carregando até hoje as cicatrizes disso tudo na forma de celulite.

Will é protestante (os ancestrais dele vieram da Inglaterra e da Escócia). Não tem
sotaque perceptível; não tem celulite. Na casa dos pais dele, o molho do espaguete sai de um pote.

Mas ele, assim como eu, ansiou a vida toda por fugir das garras da vida na cidade
pequena e morar na cidade de Nova York. A diferença era que, para ele, estar na Universidade Estadual de Nova York em Brookside era um passo enorme em direção a seu sonho. Eu não tinha coragem de dizer a ele que Brookside poderia muito bem se localizar em Iowa que não faria diferença alguma. Ele acabou descobrindo por si mesmo, e depois nem participou da
formatura, para poder fugir dali o mais rápido possível.

Quando nos conhecemos naquele primeiro semestre do penúltimo ano, ele tinha uma namorada em sua cidade natal, Des Moines, no estado de Iowa, e eu morava em casa, a cinco quilômetros do campus, com meus pais. Nossa aproximação foi gradual, e o culpado disso é exclusivamente
Will. Em retrospecto, percebo que ele estava indeciso entre trair a namorada ou dar o fora nela (e em mim também) para poder ficar com quantas quisesse.

Costumava falar sobre ela para mim sem restrições, de uma maneira despreocupada e enlouquecedora, sugerindo que não passávamos de amigos. Se eu aparecesse no apartamento dele sem avisar e ele estivesse falando com ela ao telefone, não fazia nenhuma menção de desligar e, quando finalmente terminava a conversa, dizia em tom sossegado:

"Ah, era Helene." Eu achava que, se ele nos considerasse mais do que amigos (nas palavras dele), que davam uns beijos sempre que bebiam demais e se cruzavam em algum bar, ele seria bem
mais evasivo a respeito da namorada.

Então, o nome dela era Helene e, naturalmente, eu a imaginava esguia e exótica.

Então Will foi passar o feriado do Natal na casa dos pais e confiou a mim as chaves do apartamento, para que eu pudesse regar as plantas dele. Sim, ele tinha plantas. Não pés de maconha, que com freqüência eram cultivados nas casas de fraternidade próximas ao campus. Também não era um cacto ou uma daquelas espadas-de-são-jorge que parecem de borracha e
que você pode enfiar no armário e passar um ano sem colocar água que continuam
viçosas.

Não, Will tinha plantas caseiras comuns, do tipo que precisa de sol, de água e de fertilizante.

De todo modo, o episódio de me confiar as chaves ocorreu antes de começarmos a ir para a cama, mas depois de ele já ter lutado contra o fecho do meu sutiã vezes suficientes para que eu optasse por um modelo menos firme. Normalmente, eu usava um modelo com fecho industrial, com quatro ganchos e colchetes sobre uma faixa elástica com a largura de Silver Tape.

Fiquei siderada com o fato de ele me confiar não apenas as plantas que tinha comprado na seção de jardinagem do Wal-Mart local em setembro, mas também o conteúdo completo do apartamento que ele dividia com outros dois alunos. Será que ele não desconfiou que eu passaria horas examinando os caixotes de plástico de leite que ele guardava no armário, lendo as cartas de Helene e procurando fotos dela?

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